sexta-feira, 13 de maio de 2011

Eu a vi passar. Passou por mim como se nem existisse, como se fora uma réplica da que um dia existiu de verdade. Andava a passos lentos e pesados. Pesados, mais pesados que o peso que habitava a sua consciência. Os olhos marejados, já não choravam mais, perderam todo seu brilho. Só uma lágrima, já seca por causa do tempo, teimava em aparecer no canto de seus olhos. Ouvi dizer algumas vezes que os olhos são as janelas da alma; os dela, porém, pareciam sem alma alguma, e apenas continuavam a enxergar, pois não sabiam como fazer parar. Enxergava como se respira - automaticamente - sem opção de parar ou continuar.
Suas janelas fechadas encontraram as minhas ainda tão abertas e brilhantes. Sofri quando a vi assim; sofri com ela, quis sofrer por ela. Pensei em afagar-lhe os cabelos e dizer-lhe palavras confortantes, mas, decerto, não havia meios de reconfortá-la. Ousei chorar em seu lugar.
Eu a vi passar. Passou com seu jeito perdido; parecia não saber, se quer, para onde ir. Quando ela me viu de volta, resgatou memórias e sofreu, mais uma vez, desde o início. Desfalecida, caminhava. Há pouco perdera o filho, perdera uma parte de si. Se permitiu enterrar junto à ele para não esquecer de sentir seu cheiro, ou o som da sua voz, ou a cor do seus cabelos. Agora, privada dos sentidos, perambulava em um mundo ao qual nem pertencia mais.